A declaração da presidenta Dilma, na manhã de hoje, instada por repórteres que ela mesma convidou para compartilhar um café da manhã, encerra um capítulo da política. Pelo menos para mim.
Provocada a repercutir os boatos sobre a abertura do capital da Caixa Econômica Federal, Dilma confirmou a notícia, ponderando somente que é um "processo que demora".
O AntiPIG nasceu da inconformidade com a imprensa dominante brasileira, que se assumiu como partido de oposição e passou a fazer uma cobertura perniciosa dos atos do governo brasileiro. Lá em 2010 nos chamava a atenção o monopólio exercido por um grupo de empresas com flagrantes interesses em interromper o ciclo petista de poder, iniciado com Lula e continuado por Dilma.
Passamos a enxergar o inverso do pensamento crítico no PIG: se vinha do governo, não prestava. Dólar em alta demonstrava equívoco do governo; dólar em baixa, decisão errada do governo. Por fim, tentávamos contrapor notícias positivas, que demonstravam vitórias brasileiras ou de brasileiros diante do cenário catastrófico e pré apocalíptico pintado em cores berrantes nos quadros do jornalismo protofascista, alimentado pelo PIG.
Contudo, não nos cegamos para questões problemáticas. Logo após a eleição de 2010, republicamos um artigo de Gilberto Maringoni intitulado "As relações ambíguas do Governo com a Mídia" cuja veracidade explodiu na nossa cara recentemente, com a cobertura da eleição de 2014 e a revelação do bolsa-PIG. Ainda assim, por termos alguma vivência nos meandros da política, sabíamos da ingenuidade de esperar pureza angelical nos homens que lidam com a coisa pública. Em suma, apesar das contradições internas, por ser forçosamente uma coalizão em permanente tensão, em correlação de forças, acreditávamos que esse governo poderia realizar o projeto de um grande país. Reitero: apesar das contradições internas.
Para esse projeto víamos a Caixa Econômica Federal como determinante no papel das políticas públicas com corte financeiro. Uma empresa pública, que durante o período FHC se tornou banco múltiplo, além das suas consagradas atribuições de poupança popular e financiadora da casa própria.
A Caixa financia diretamente o salto qualitativo na infra-estrutura do país, aportando recursos para grandes obras que nos foram negadas por duas décadas: estradas, pontes, usinas de força, portos, aeroportos. Linhas de crédito conjugadas à expertise do corpo técnico da empresa já consagrado no saneamento e na construção civil.
E por ter sido historicamente o banco dos pobres, a sede do penhor, a cara da poupança do brasileiro, a CAIXA atuava com ainda mais ênfase na promoção da cidadania, permitindo a bancarização das classes marginalizadas, contribuindo para formalização dos empregos (o FGTS é outra atribuição da CAIXA), estendendo sua rede de atendimento para o pagamento dos benefícios sociais e a transferência direta de renda para a população.
Com isso, a CAIXA enfrentaria as duas grandes chagas da civilização brasileira: o combate, através de políticas governamentais sistemáticas da iniquidade denominada desigualdade social, e solucionaria o problema do nosso deficit logístico para o escoamento da produção, o acesso aos mercados, a integração do país e o crescimento do mercado interno. A Caixa é a prova cabal de que a intervenção estatal na economia, e não a mão invisível do mercado, é que regula e orienta o desenvolvimento da nação.
Porém, com a fala de hoje, Dilma abre mão disso. Em 23 de outubro, o discurso era feito em outro sentido, se comprometendo a fortalecer as instituições financeiras públicas, "que são indispensáveis para a economia brasileira e um patrimônio da sociedade". Pior, abre mão do futuro, porque depois que os especuladores avançarem suas garras no patrimônio brasileiro, nunca mais, vide Petrobras. O que restará? Os sindicatos de trabalhadores pedirão ao governo que recompre as ações da empresa?
É o fim de um modelo desenvolvimentista de capitalismo. Troca-se a lógica de nação auto-determinda pela do mercado. É quase como sugeriu Paulo Henrique Amorim, quando afirmou que o bolsa-família seria operada pela Wal-Mart, caso o PSDB ganhasse. Nem precisaram ganhar a eleição.
Por fim, essa notícia também decreta o fim do AntiPIG. Não há mais sentido em lutar contra os próprios aliados. Não consigo defender aquilo em que não acredito, apenas por exercício de retórica. Cada uma das 276 postagens valeu a pena, mas hoje seguiremos outro caminho. O governo saberá se defender, como tem demonstrado de maneira recorrente. E nós, no esteio de Plínio Marcos, continuaremos a provocar e a inquietar os espíritos mais empedernidos para as lutas comuns da libertação.