Os últimos anos têm nos reservados obituários difíceis de suportar. Ano passado se foram, nos últimos meses, Eric Hobsbawn e Oscar Niemeyer, o estudioso e o artista, o metódico e o gênio, o historiador e o inovador, humanistas que elevaram a dignidade da espécie a qual pertencemos.
Agora, depois do adeus a Hugo Chavez, lamentamos a passagem de Mandela. Nas palavras do presidente sul-africano Jacob Zuma, "Esta nação perdeu um grande filho". Vou além, e digo que o mundo se despediu de um gigante, talvez como os que povoaram a terra no princípio dos tempos. Um colosso em estatura moral.
(...)
Plutarco foi o criador do gênero que conhecemos como biografia. Sua monumental obra, Vidas Paralelas, traz 23 pares de relatos da vida de um grego e a de um romano. A mais conhecida é a que contrapõe Alexandre a Júlio César. Não de hoje, mas é fato que no mundo moderno, há um paralelo entre Mandela e Lula. A origem humilde, na essência de suas respectivas pátrias, a luta contra a legalidade instituída de forma iníqua, a formação de um partido político que representa o povo à margem das decisões e, o principal, a renúncia à vingança como forma de fazer política, apesar das absurdas injustiças que sofreram. Os "grandes interlocutores dos pobres", nas palavras de Bono Vox.
Um capítulo menor deste paralelo é a capacidade de preparar terreno para seus sucessores, que continuam sendo assediados pelo poder econômico: Na África do Sul, primeiro foi Thabo Mbeki, que o seguiu, rotulado ora como "radical", ora como "intransigente". Depois veio Jacob Zuma, tachado de "populista", além de impropérios mais baixos. Aqui, todos os defeitos foram imputados à Dilma Rousseff, por enquanto.
(...)
É importante aos incautos saber que Mandela tinha lado. Ou, usando uma palavra que cada vez mais se torna obscura, ele tinha ideologia. Era um socialista democrático que, quando bloqueado pela repressão, não hesitou em defender suas ideias pelos meios que estivessem à disposição. O poder branco, e todos os que legitimaram a bestialidade que ocorreu na áfrica do sul tinham em Mandela um adversário.
Reproduzimos abaixo o texto de Atílio A. Borón, do jornal Página 12, da Argentina. Foi transcrito no Conversa Afiada e traduzido pelo ANTI-PIG.
A
morte de Nelson Mandela precipitou uma enxurrada de interpretações de
sua vida e obra, todas as quais apresentam-no como um apóstolo do pacifismo e
uma espécie de Madre Teresa na África do Sul.
Se trata de
uma imagem essencial e premeditadamente errada, que ignora que, após o
massacre de Sharpeville, em 1960, o Congresso Nacional Africano (CNA)
e seu líder, precisamente Mandela, adotaram a luta armada e sabotagem a
empresas e grandes projetos econômicos, porém sem atentar contra vidas humanas.
Mandela recorreu a vários países da África em busca de ajuda econômica e militar para sustentar esta nova tática de luta. Caiu
preso em 1962 e pouco depois foi condenado à prisão perpétua, o que iria
mantê-lo relegado a um cárcere de segurança máxima, uma cela de
dois por dois metros, durante 25 anos, exceto os dois últimos anos em
que a formidável pressão internacional para alcançar sua libertação melhoraram as condições de sua detenção.
Mandela,
portanto, não foi um "adorador da legalidade burguesa", mas um extraordinário líder
político cuja estratégia e táticas de combate foram
variando conforme as diferentes condições sob as quais lutava suas
batalhas.
Dizem que foi o homem que acabou com a odioso "apartheid" sul-africano, o que é uma meia-verdade. A
outra metade do mérito cabe a Fidel e a Revolução Cubana, que com sua intervenção na guerra civil angolana selou o destino dos racistas, ao
derrotar as tropas do Zaire (hoje República Democrática do Congo), o
Exército Sul-Africano e dois exércitos mercenários angolanos organizados, armados e financiados pelo os EUA através da CIA.
Graças
à sua heroica colaboração, na qual uma vez mais se demonstrou o
nobre internacionalismo da Revolução Cubana, se conseguiu manter a
independência de Angola, assentar as bases para a posterior emancipação da Namíbia e disparar o tiro de misericórdia contra o "apartheid" sul-africano. Por isso, interado do resultado da crucial batalha de Cuito Cuanavale, em 23
de março de 1988, Mandela escreveu desde o cárcere que o desfecho do que foi
chamado de "a Stalingrado Africana" era "o ponto de inflexão para a libertação do nosso continente, e do meu povo, do flagelo do apartheid".
A
derrota dos racistas e seus mentores americanos desferiu um golpe mortal à
ocupação sul-africana da Namíbia e precipitou o início das
negociações com o CNA que, em pouco tempo, terminaria por demolir o
regime racista sul-africano, obra conjunta daqueles dois gigantescos estadistas e revolucionários. Anos
mais tarde, na Conferência da Solidariedade cubana-sul-africana de 1995,
Mandela diria que "os cubanos vieram para a nossa região, como médicos,
professores, soldados, técnicos agrícolas, mas nunca como
colonizadores. Eles
compartilharam as mesmas trincheiras na luta contra o colonialismo, o
subdesenvolvimento e o 'apartheid'... Jamais esqueceremos este incomparável exemplo de desinteressado internacionalismo". É um bom lembrete para aqueles que falam da "invasão" cubana a Angola.
Cuba
pagou um preço enorme para este nobre ato de solidariedade
internacional que, como recorda Mandela, foi o ponto de inflexão da luta
contra o racismo na África. Entre 1975 e 1991, cerca de 450.000 homens e mulheres da ilha foram parar em Angola, jogando-se nisso suas vidas. Pouco mais de 2.600 perderam-na lutando para derrotar o regime racista de Pretória e de seus aliados. A
morte deste líder extraordinário que foi Nelson Mandela é uma excelente
ocasião para render homenagem à sua luta e também ao heroísmo
internacionalista de Fidel e da Revolução Cubana.
2 comentários:
Marco, teu blog não tem botões de compartilhamento (via Twitter, G+, FB ...). Tem como acrescentar pra gente poder ajudar a divulgar o blog?
Ao lado direito, na parte de cima, eles estão lá.
Não consegui configurar a barrinha abaixo do texto.
Auxílios serão muito bem vindos!
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