sábado, 31 de maio de 2014

EL NEGRO JEFE

O futebol mudou desde que o Brasil sediou o IV Campeonato Mundial, em 1950. Aos heróis demasiadamente humanos de antanho sucederam-se as celebridades midiáticas. Ao invés de se admirar o talento ou, como aqui exposto, o caráter, importa mais o corte de cabelo e o número de publicidades a que se associam. Em realidade, o mundo mudou desde aquele já longínquo 1950. Mas não a ponto de que esqueçamos os exemplos daquela época.

Quero falar de Obdulio Varela, capitão uruguaio naquele mundial de lembranças tão traumáticas aos brasileiros. Nasceu mulato, pobre e asmático num bairro humilde de Montevidéu, em 1917. Filho de pais separados, frequentou poucos anos da escola primária, mas desde pequeno mostrava uma maturidade impressionante. Ainda criança, vendia jornais para ajudar a mãe, e dizia que as únicas coisas verdadeiras nos periódicos eram o valor e a data. Quando iniciou no futebol, trabalhou como servente de pedreiro.

E como era Obdulio Varela do ponto de vista técnico?

Ocupava a posição que agora chamamos de volante, mas que àquela época se designava como "centre half". Seu rendimento técnico não ia além do aceitável, quiçá bom. Não era veloz, tampouco corpulento, dominava os distintos recursos dentro do que se espera habitualmente de um jogador de primeira divisão e só. Nesses aspectos não se sobressaía.

Mas então, onde estava o diferencial que o converteu num mito que transcendeu a história futebolística? Na sua personalidade.

Ela que deu significado ao apelido "Negro Jefe". Sem gritos ou histeria, sabia conduzir seriamente seus companheiros de equipe quando estes não faziam as coisas como deviam; bastavam poucas palavras, ou apenas um olhar cheio de rigor, como de um pai severo com seus filhos, para se darem conta de que deveriam empenhar-se mais em tal ou qual aspecto do jogo. Era respeitado e temido por seus oponentes, os quais sabiam não ser conveniente buscar problemas com esse "gran negro". Os demais jogadores da celeste o tratavam por Sr. Obdulio.

Nunca perdia os nervos e sabia quanto valem os gestos. Ainda que tenha sido um jogador viril, sempre foi partidário do fair play, repudiando manhas e desdenhando da brutalidade. Em certa ocasião, como capitão do Peñarol, um adversário acertou de forma violenta e maldosa um de seus companheiros. A agressividade desse oponente merecia a expulsão imediata, sem dúvidas. Porém, de forma inexplicável, a dita falta foi sancionada como simples contingência de jogo. Obdulio Varela tomou de imediato a bola, se dirigiu ao juiz de forma respeitosa, e asseverou: "Senhor Juiz, se alguém do meu time der um coice como aquele senhor acabou de dar, rogo que o expulse, porque em minha equipe jogador que age assim não merece seguir em campo". Como capitão, não poderia tolerar que um dos seus praticasse semelhante ato tão desprezível.

Noutra passagem, após uma vitória de seu Peñarol sobre a máquina do River Plate argentino, os eufóricos cartolas decidiram premiar a todos os jogadores com 250 pesos, e ele com 500. El Negro Jefe não concordou: "Eu joguei como todos; se vocês creem que mereci 500 pesos, são 500 para todos; se eles mereceram 250, eu também". E foram 500 para todos.

Os dirigentes o odiavam; a recíproca era verdadeira. Sua liderança natural o colocou na frente na maior greve de jogadores de futebol de todos os tempos, que durou 7 meses, em 1948, visando o reconhecimento de direitos trabalhistas e de formarem seu sindicato.

Contudo, o grande caráter de Obdulio Varela se plasmou com nitidez na copa de 1950. Sua atuação no torneio o catapultou à história. Na copa, foi possível observar o homem e seus recursos psico-emocionais, sua astúcia, o conhecimento e a perspicácia para perceber as virtudes e também o calcanhar de aquiles dos adversários e, de posse dessas elementos, determinar a forma adequada para manipular ou aproveitar as diversas reações dos mesmos em benefício próprio.

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Não é um texto masoquista; muito menos uma expiação de toda raiva que a falta de auto-estima brasileira me causa. Por tanto, não entraremos nos pormenores da tragédia que se abateu no Maracanã, em 16 de julho de 1950. Até porque o carrasco foi tão magnânimo que só engradeceu nossa derrota. Não deveria nem constar nos anais da história: é lenda. Basta a descrição de Nélson Rodrigues: "Varela não atava as chuteiras com os cadarços, mas com as veias".

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Nunca mais se jogará uma partida como o Maracanaço, nem existem mais homens como El Negro Jefe. A seleção brasileira ficou sem jogar por dois anos e aposentaram o uniforme branco, utilizado até então. Já se escreveu muito sobre aquele fatídico dia, a final do fim do mundo e sobre a façanha de Varela. Mas realmente épica foi a noite. El Negro saiu para beber aquela noite, uma noite que durou 46 anos. Por si só, esse fato já é um testemunho da diferença entre o futebol de então e o de hoje. Acabara de protagonizar o mais chocante feito da história das copas: a vitória de virada sobre a favorita seleção anfitriã, proclamada campeã por antecipação pelos jornais brasileiros.

Depois de algumas doses, El Negro Jefe é chamado pelo dono do bar. Ele o apresenta a um inconsolável torcedor brasileiro e diz: "Sabe quem é esse? É Obdulio". O próprio Obdulio narra o episódio: "Eu pensei que ia me matar. Mas me olhou, me deu um abraço e seguiu chorando. Depois de um tempo me disse: 'Obdulio, poderia beber conosco? Queremos esquecer, sabe?'. Como eu ia dizer que não! Estivemos a noite toda bebendo nos bares. Eu pensei: 'Se tenho que morrer nesta noite, que seja'. Mas estou aqui. Se tivesse que jogar outra vez essa final, faria um gol contra, sim senhor. Não, não se assombre. A única coisa que conseguimos ao ganhar esse título foi dar brilho aos dirigentes da Associação Uruguaia de Futebol. Eles se deram medalhas de ouro e aos jogadores deram umas de prata".

Muito tempo depois, Varela diria que nesse momento, com o torcedor brasileiro chorando em seu peito, ele se havia dado conta da dimensão daquela derrota para o Brasil. Também afirmaria que se soubesse que aconteceria tal tragédia nacional, ele não teria se esforçado tanto para ganhar, pois, afinal de contas, só os cartolas uruguaios lucraram com aquela vitória.



Nessa noite amarga para o Brasil, El Negro Jefe se recusou a celebrar a vitória com seus companheiros. No dia seguinte, não quis fotos, nem compartilhar os festejos com os dirigentes. Não sentia nenhum ardor patriótico. A explicação? "Minha pátria é a gente que sofre". Lhe deram dinheiro suficiente para comprar um carro velho, um Ford 1931, que foi roubado na semana seguinte.

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Varela se retirou do futebol em 1955, a tempo de recusar vestir uma camisa patrocinada, uma novidade na época, mesmo com o contrato prevendo dinheiro para os jogadores. Até ele deixar definitivamente os gramados, o Peñarol entrou em campo com dez jogadores patrocinados e seu veterano capitão usando a velha camisa de sempre. Justificou sua atitude declarando: "antes, nós, os negros, éramos puxados por uma argola no nariz. Esse tempo já passou".

Tentou ser técnico, mas não suportava a interferência dos diretores. Como seus antigos colegas, ao pendurar as chuteiras, continuou a trabalhar, desta feita como servidor público, onde finalmente se aposentou em 1972.

No futebol, são inúmeros os exemplos de atletas lendários por seu desempenho. De Pelé a Maradona, de Messi a Neymar, na imensa maioria dos grandes personagens, o brilho se origina de uma característica específica: o domínio dos fundamentos, a técnica, que os torna brilhantes e incomparáveis. De certa forma, cada um deles pode se constituir num modelo para a enorme quantidade de variantes que apresenta esse maravilhoso esporte coletivo. Todavia, é muito difícil encontrar nesse panteão alguém cujo maior feito estava em si mesmo, e sua "mente fria, pernas fortes e coração ardente".

Por fim, é necessário destacar a ética de Obdulio Varela. Longe dos campos, se dedicou à querida esposa Catalina e aos filhos. O maior espaço de sua vida era para a família e os amigos mais chegados. Durante o resto da vida foi requisitado pela imprensa: escrita, radiofônica e logo também a televisiva. Quase sempre recusou-as. Nas várias décadas que se seguiram ao seu afastamento, em pouquíssimas ocasiões aceitou conversar com alguma reportagem. Dentro dessa grande personalidade, vital em todo sentido, de postura firme, sólida, se ocultava também um homem humilde, que nunca quis ser endeusado, dado que também reconhecia suas limitações.

Não há dúvidas que por trás de todos aqueles que buscam o primeiro plano a qualquer custo, a necessidade imperiosa de serem reconhecidos, de serem entrevistados, mostrados, existe alguma debilidade emocional, a busca da auto-afirmação. Sem isso, se encontram "vazios", desprotegidos, frágeis e aparentam uma vida sem sentido. Obdulio Varela não necessitava destas escoras de apoio, se postando muito acima destas carências. Seu caráter, seus entes queridos e os poucos amigos da intimidade eram suficientes.

Contudo, esse homem que poderia assustar ao capeta quando se punha sério, era também uma pessoa muito sensível. Em 1996, falece o grande amor da sua vida, Catalina. Obdulio não resiste a essa dor e exatamente em 02 de agosto do mesmo ano também sucumbe perante a morte. O presidente uruguaio dispõe que lhe tributem honras especiais. O Uruguai estava em luto, chorando a perda do famoso Negro Jefe.

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Fontes:
http://leyendasyrelatosdefutbol.blogspot.com.br/2009/03/recordando-obdulio-varela-el-negro-jefe.html  (trecho do artigo “Obdulio Varela, el reposo del centrojás, en Artistas, locos y criminales”, de Osvaldo Soriano. Bruguera, 1983)
http://www.efdeportes.com/efd100/obdulio.htm  (Artigo de Jorge de Hegedüs, 2006)

terça-feira, 27 de maio de 2014

ORGULHO DE SER BRASILEIRO!

 
Mineiro de Belo Horizonte, William, hoje aos 20 anos, estudou desde a infância em escolas públicas, sendo uma municipal de Barbacena, no Campo das Vertentes, e depois uma estadual, em Ibirité, na região metropolitana. Na infância, ele foi diagnosticado como hiperativo, e os professores tentavam "entretê-lo" com tarefas extras. "Sempre gostei muito de estudar, e me destacava pelo rendimento nas aulas. Sempre me interessei pelos estudos, sobretudo pela matemática, que até hoje me fascina", conta. Em 2012, ele foi aprovado no Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) com a maior nota da região Sudeste do país, o que o proporcionou a possibilidade de cursar engenharia química na Universidade de Salamanca, na Espanha.

Perguntaram a William se ele pretende voltar ao Brasil:

"Não só pretendo como devo fazê-lo. O convênio do MEC com a Universidade de Salamanca pelo qual estou aqui prevê o meu retorno ao Brasil ao final da graduação. E mais: sinto ter um dever para com o nosso país, que acreditou em mim e investiu os nossos recursos na minha formação no exterior".


Na abertura da Copa do Mundo, será feita a primeira demonstração pública de um exoesqueleto controlado pela mente, que permite que pessoas paraplégicas caminhem. A roupa robótica será vista por 70 mil pessoas no estádio e por bilhões em todo o mundo, na televisão.

O exoesqueleto foi desenvolvido por um grupo de cientistas que fazem parte do projeto Caminhar de Novo, e é o resultado de anos de pesquisa de Miguel Nicolelis, neurocientista brasileiro. Nicolelis acredita que a demonstração na Copa é uma forma de promover também a imagem dos cientistas brasileiros.

"Também é a nossa intenção mostrar para o mundo um outro Brasil. Mostrar que aqui no Brasil também se pode fazer grandes projetos científicos com impacto humanitário e mostrar que existe um outro país, um país que cresceu muito nos últimos anos, melhorou a vida de muita gente, mas que ainda pode fazer coisas muito impressionantes não só para os brasileiros, mas para todo o mundo."


Nele, sugere que o Brasil encontra-se diante de uma oportunidade única de potencializar seu desenvolvimento científico e educacional, através da cooperação entre ambos, e propõe quinze medidas necessárias para o país firmar-se como uma liderança mundial na produção e uso democratizante do conhecimento. O documento repete a ênfase na descentralização da produção científica e na aproximação entre pesquisa e escola, seguindo o exemplo do Instituto Internacional de Neurociências de Natal.


Sem medo de se mostrar a favor da política econômica da presidente Dilma Rousseff, a empresária Luiza Helena Trajano mandou um recado bastante irônico a seus colegas que têm criticado o governo. "Está tão ruim? Então vende o negócio e muda de país", disse ela em entrevista ao jornal Zero Hora, do Rio Grande do Sul. "Trabalha aqui, ganha dinheiro aqui e acha que está tudo ruim? O Brasil é nosso, não adianta reclamar de mim mesma", completou.
A empresária que pilota uma das maiores redes de vendas de eletrodomésticos do País defendeu o que classificou como "otimismo participativo". Luiza acrescentou que os empresários deveriam fazer mais e reclamar menos. "Não adianta eu reclamar de mim mesma", frisou. "À medida que eu estou reclamando do país, eu estou reclamando de mim. O que eu posso fazer para ajudar? Quem se sente responsável não aponta dedo".
Para sustentar seu discurso a favor, a empresária fez comparações com a situação econômica de outros países. "O país passou por uma crise global (2008) quase ileso. Afetou todo mundo e nós não sentimos", acentuou. "Dia desses recebi um empresário espanhol que me contou que os jovens na Espanha não têm emprego. E nossos jovens têm. Há coisas para melhorar, mas só nós conseguiremos isso. A renda triplicou em 10 anos".


Luiz Amorim foi alfabetizado aos 16 anos e, aos 18, quando leu o primeiro livro, não parou mais. Ele percebeu na leitura, e especialmente na filosofia, novos horizontes para a vida e para o empreendedorismo. Vindo de Salvador para Brasília com a mãe e os cinco irmãos, trabalhou como engraxate, vigia e lavador de carros antes de ir morar nos fundos de um açougue, onde aprendeu o ofício que se tornou paixão. Durante o tempo em que morou nos fundos da loja, lia qualquer livro que encontrava para passar o tempo e acabou se tornando um apaixonado pela leitura e militante por políticas de fácil acesso aos livros.

Em 1994, com o dinheiro que juntou a vida inteira, conseguiu comprar o açougue e instalou uma pequena estante de livros. Com perseverança e por meio de doações recebidas, transformou o Açougue Cultural T-Bone no primeiro estabelecimento no mundo a juntar carnes e livros.

Apesar de ter como pensador favorito Karl Marx — uma aparente contradição para um homem no mundo do negócios, como ele próprio salienta — Luiz é um homem de pensamento livre, e acredita que conseguiu, assim, mostrar que no capitalismo tem espaço para compartilhar um bem precioso em qualquer sociedade democrática: a cidadania. “Não sigo nenhuma linha de pensamento nem política partidária. Meu partido é a arte. Eu acho que com ela é possível melhorar o negócio e ter mais sustentabilidade. O bom empreendedor tem que estar ligado à arte. Precisamos de mais poesia, os empresários precisam de mais poesia. Dessa forma, eles vão conseguir se relacionar melhor com seus funcionários.”

Além das atividades comerciais, o Açougue Cultural T-Bone tem diversas programações culturais e já reuniu grandes artistas da MPB. Outro projeto é a "Parada Cultural - Biblioteca Popular 24 horas", que disponibiliza em cada ponto de ônibus de Brasília uma mini-biblioteca, em que as pessoas pegam livros emprestados, leem e os devolvem em qualquer outro ponto da cidade. O interessante é que o índice de perda ou dano dos livros é baixíssimo.

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Em poucos minutos de pesquisa na internet, é fácil encontrar gente assim, que sintetiza a grandeza da alma brasileira. São essas pessoas que formam e dão sentido ao que Darcy Ribeiro escreveu em O Povo Brasileiro. Somos a terra da miscigenação, ainda que por vezes violenta, quase sempre contraditória e que produz expoentes em todos os ramos da aventura humana.

Gente simples, honesta e trabalhadora.
Gente que luta a batalha do dia a dia com um sorriso franco.
 
Gente que orgulha um país inteiro.





sábado, 24 de maio de 2014

A RAPOSA E O GALINHEIRO



Um grande amigo, que faz críticas ao governo petista pela esquerda, costuma dizer que se fosse para implantar o neoliberalismo, era melhor votar nos especialistas da matéria, os políticos da direita. Infelizmente, não podemos assumir esse discurso. Ainda que compartilhemos dessa idéia, qualquer crítica soaria como abandono de posição, como capitulação no meio da batalha. Vivemos numa era de profunda hipocrisia, e as maiores se escondem em neologismos e num linguajar especial para camuflar as reais intenções do interlocutor.

Macaco Simão percebeu isso há algum tempo no vocabulário usado pelos correligionários do PSDB, o tucanês. Nesse dialeto, cheque sem fundo vira “documento de ordem de pagamento imediato sobre banco ou casa bancária, para satisfazer uma dívida, em que há excesso de despesa em relação à receita”; o gordo oferece uma “imagem corporal alternativa”; “informalidade ocupacional” é o famoso biscatear; e o racionamento por falta d’água é tratado como “rodízio por estresse hídrico”.

Ao que tudo indica, nessa campanha parece que eles se ofenderam com a fama que lhes é imputada e rasgaram o dicionário tucanês. Num belo dia, ao invés de propor “ajustes necessários ao recrudescimento das decisões afetas às classes majoritárias”, Aécio Neves, num raro momento de lucidez, prometeu medidas impopulares. Que ele é partidário do arrocho, pelos professores mineiros 150 dias em greve, criminalização dos movimentos sociais e fechamento de qualquer canal de diálogo com a sociedade, já sabíamos. Inédito é assumir, em termos nada pudicos, que o povo que se lasque. No receituário neoliberal, governo bom é governo para minoria.

No mesmo diapasão, o guru e mentor Armínio Fraga, responsável pelo "programa de organização financeira e administração fazendária do presidenciável" (traduzido do tucanês significa: aquele que está de olho na chave do cofre), reclamou que o salário mínimo está alto. Noutras eras, mediria palavras, ao afirmar que “as demandas empresariais sofrem grande pressão pela massa pecuniária direcionada aos colaboradores das organizações”.



Talvez sintam-se confortáveis para expressar tranquilamente o pensam pela segurança que o PIG lhe oferece. Só que isso não rende voto. Até agrada aos suscetíveis eleitores que congregam o contingente denominado “antipetista”. Votos ideológicos e conscientes apenas do 1% que controla a maior parte do capital.

Tanto é assim, que um elogio do PIG acabou por revelar mais do que devia. Timothy Geithner, ex-secretário do tesouro americano, sugeriu a Barack Obama o nome de Armínio Fraga para o banco central americano, o Federal Reserve. É bom lembrar que o Fed é diferente do BACEN, subordinado ao Estado brasileiro: o FED é uma instituição privada que defende bancos privados. É isso que o mercado clama quando pede mais "autonomia" ao Banco central brasileiro.

Armínio, que entende ser o momento do Brasil se "reengatar nas grandes economias mundiais", ex-presidente do BACEN no governo FHC, foi chamado de “confiável e competente”, além de “líder notável” por Geithner em seu livro de memórias, Stress Test – Reflexões sobre Crises Financeiras, onde rememora a crise financeira global de 1998, que levou à desvalorização do real, após um período de paridade com o dólar.

Prossegue o ex-secretário: “Após abandonar uma tentativa inicial de se manter a paridade do real com o dólar, uma liderança econômica soberba do Brasil conseguiu dar a volta por cima em poucos meses”. Ao explicar os pacotes de ajuda do governo norte-americano, acrescenta que “só funcionaram quando lidamos com líderes competentes e confiáveis”.

“O presidente do banco central brasileiro, Armínio Fraga, que também possui cidadania americana, foi tão notável que mais tarde eu o mencionei para o presidente Obama como um potencial presidente do Fed (o BC americano)”, escreve.

Aí está cereja do bolo. Para ser cidadão estadunidense, são necessários vários requisitos: 18 anos, residir nos EUA por cinco anos consecutivos e estar presente fisicamente no país, bons antecedentes, proficiência no inglês, conhecimentos da história e do governo dos EUA e fazer o voto de lealdade. O voto de lealdade é uma espécie de juramento à bandeira, que implica em renunciar a fidelidades estrangeiras, endossar à Constituição ianque e servir aos Estados Unidos, como parte das forças armadas ou por serviços civis.

Esse é o cara que querem colocar para comandar nossa economia. O teor do voto de lealdade, numa tradução aproximada, é o seguinte: “Juro (ou afirmo) solenemente que apoiarei e defenderei a Constituição dos Estados Unidos contra todos os inimigos, estrangeiros e domésticos; que prestarei verdadeira fé e lealdade à mesma; e que aceito esta obrigação livremente, sem qualquer reserva mental, ou intenção de evasão; Assim me ajude Deus”.

Estaríamos remontando Hans Christian Andersen, e a história da raposa cuidando do galinheiro? Ou, tucanando a fábula, “Aves deglutíveis sob atenta vigilância de canídeos em estado selvagem”? Como disse meu grande amigo, para um governo de exclusão social deveríamos eleger o PSDB. Contam com expertise e know how imbatíveis. Respeitando a mesma linha de raciocínio, para defender os interesses americanos e fuder de vez com a nossa soberania, nada melhor que colocar no timão da economia alguém que jurou lealdade aos Estados Unidos.

quinta-feira, 22 de maio de 2014

O CORVO GRASNA ALTO

"O senhor Getúlio Vargas, senador, não deve ser candidato à Presidência. Candidato, não deve ser eleito. Eleito, não deve tomar posse. Empossado, devemos recorrer à revolução para impedi-lo de governar."
Carlos Lacerda, em 1º. De junho de 1950, no jornal Tribuna da Imprensa.

Troque-se o "senhor Getúlio Vargas, senador" por Dilma, Lula, ou de forma mais abrangente, o PT. Teremos um retrato fidedigno do que rola nas redes sociais.

Algum tempo atrás, alguém sonhou que as facilidades que a informática traziam uma espécie de democracia direta, na qual cada um plugado em suas máquinas decidiria pelas questões públicas. Não sei se por inocência ou má-fé, o fato é que essa teoria/profecia é uma das maiores bobagens já pensadas. 

Que tipo de cidadão exerceria a plenitude de seus direitos políticos atrás de um teclado, no anonimato, replicando memes infames, para os quais não reservaria qualquer preocupação em checar a veracidade, instilando o ódio, açulando os sentimentos mais baixos de inveja, cobiça, mesquinhez que, sob a carapuça da nova ordem feicibuquiana ganha o garboso nome de individualidade?

A "ciberdemocracia" fracassou miseravelmente porque desconsidera o elemento principal: o cidadão. Aos acéfalos da internet faltam requisitos básicos de cidadania; no mínimo, o que Pepe Mujica chama de honradez intelectual.

Dizem que a cabeça pensante por trás desse movimento que conseguiu fazer gente que compartilhava piadas, mensagens de auto-ajuda, fotos de festas ou pratos de comida acreditar que está na moda esculhambar o governo (ainda que isso seja reflexo do complexo de vira-latas) é o ex-astrólogo Olavo de Carvalho, que conseguiu abarcar sob sua túnica os expoentes do PIG, ilustrados ao lado.

Remontemos alguns anos, até pela insignificância desse personagem. O mentor intelectual do golpe digital é o Corvo, Carlos Lacerda, que das catacumbas onde se decompõe continua grasnando alto. Lacerda falava a plenos pulmões o que a UDN, sua facção política tinha vergonha de admitir: que era contra o povo, a favor da elite, capacho dos interesses estrangeiros e, sobretudo, que como não tinha voto, daria o golpe, custasse o que custasse.

O PIG faz questão de apagar um pedaço de sua biografia, como se fosse a Madalena arrependida, mas o fato é que ele deu condições ideológicas e apoiou entusiasticamente o golpe militar de 1964, que jogou o Brasil numa ditadura, única forma dos que não têm voto chegarem ao poder.

Os corvetes crocitam mas não passam muito disso. Tenho um vizinho que vive reproduzindo essas imagens anti-petistas na sua página. Meia-idade, boa praça, servidor público, evangélico e cortês. Já falei para ele pessoalmente quais eram as minhas opiniões políticas, que foram recebidas entre murmúrios e silêncio, mesmo que com um quê de incredulidade. Não me respondeu nada, mas no face, a no face ele se transforma no furioso Seu Vesguinho, que distribui marteladas a torto e direitos contras os "petralhas corruptos", como este seu pacífico propínquo.
  
Agora, o lacerdismo ataca como forma de propaganda viral, através do anúncio em páginas que aceitam comerciais. Eu não soube capturar as imagens que vi ontem, mas hoje o Stanley Burburinho as publicou: uma consultoria do mercado de ações dá conselhos econômicos para como se prevenir o patrimônio em caso de reeleição da Dilma.

Por fim, a justiça, com letra minúscula, que substituiu o exército nessa versão de golpe hi-tech. Eu já não acredito que nem mesmo a martirização do José Genoíno, morrendo por falta dos cuidados necessários à sua saúde, despertará a empatia de quem já desejou o câncer do Lula, da Dilma, do Chavéz... 

Noves fora o absurdo tratamento destinado aos réus petistas, que fica ainda mais indecoroso quando se vê a iminente prescrição dos mesmos delitos cometidos pelo PSDB em Minas,  no TSE eles se superam.

Após não enxergar problema nenhum nos comerciais veiculados por Eduardo Campos, num mal ensaiado jogral com Marina Silva, como se fossem um casal em crise discutindo a relação, e mesmo o do PSDB, que curiosamente usava a metáfora de um copo cheio d'água perto de transbordar (os psicólogos explicam?), nosso patriótico judiciário, atendendo a petição dos tucanos, resolver proibir a inserção do PT, num ato de censura que orgulharia Armando Falcão, o censor-mor da ditadura.

Não há palavras; as imagens estão aí, para comparação:

O casal em D.R.

Os tucanos elogiando o governo Dilma

E o petismo atroz que atormento nosso altaneiro judiciário

Saem as fardas, entram as togas, mas a mentalidade é a mesma

Como se vê, o corvo, mesmo carcomido e dejetado pelos vermes, ainda grasna alto!

terça-feira, 20 de maio de 2014

COMPLEXO DE VIRA-LATA

Por Nelson Rodrigues, Rio de Janeiro, em 31 de Maio de 1958.

Hoje vou fazer do escrete o meu numeroso personagem da semana. Os jogadores já partiram e o Brasil vacila entre o pessimismo mais obtuso e a esperança mais frenética. Nas esquinas, nos botecos, por toda parte, há quem esbraveje: “O Brasil não vai nem se classificar!”. E, aqui, eu pergunto:

— Não será esta atitude negativa o disfarce de um otimismo inconfesso e envergonhado?

Eis a verdade, amigos: — desde 50 que o nosso futebol tem pudor de acreditar em si mesmo. A derrota frente aos uruguaios, na última batalha, ainda faz sofrer, na cara e na alma, qualquer brasileiro. Foi uma humilhação nacional que nada, absolutamente nada, pode curar. Dizem que tudo passa, mas eu vos digo: menos a dor-de-cotovelo que nos ficou dos 2 x 1. E custa crer que um escore tão pequeno possa causar uma dor tão grande. O tempo passou em vão sobre a derrota. Dir-se-ia que foi ontem, e não há oito anos, que, aos berros, Obdulio arrancou, de nós, o título. Eu disse “arrancou” como poderia dizer: “extraiu” de nós o título como se fosse um dente.

E hoje, se negamos o escrete de 58, não tenhamos dúvida: — é ainda a frustração de 50 que funciona. Gostaríamos talvez de acreditar na seleção. Mas o que nos trava é o seguinte: — o pânico de uma nova e irremediável desilusão. E guardamos, para nós mesmos, qualquer esperança. Só imagino uma coisa: — se o Brasil vence na Suécia, se volta campeão do mundo! Ah, a fé que escondemos, a fé que negamos, rebentaria todas as comportas e 60 milhões de brasileiros iam acabar no hospício.

Mas vejamos: — o escrete brasileiro tem, realmente, possibilidades concretas? Eu poderia responder, simplesmente, “não”. Mas eis a verdade:

— eu acredito no brasileiro, e pior do que isso: — sou de um patriotismo inatual e agressivo, digno de um granadeiro bigodudo. Tenho visto joga dores de outros países, inclusive os ex-fabulosos húngaros, que apanharam, aqui, do aspirante-enxertado do Flamengo. Pois bem: — não vi ninguém que se comparasse aos nossos. Fala-se num Puskas. Eu contra-argumento com um Ademir, um Didi, um Leônidas, um Jair, um Zizinho.

A pura, a santa verdade é a seguinte: — qualquer jogador brasileiro, quando se desamarra de suas inibições e se põe em estado de graça, é algo de único em matéria de fantasia, de improvisação, de invenção. Em suma:

— temos dons em excesso. E só uma coisa nos atrapalha e, por vezes, invalida as nossas qualidades. Quero aludir ao que eu poderia chamar de “complexo de vira-latas”. Estou a imaginar o espanto do leitor: — “O que vem a ser isso?” Eu explico.

Por “complexo de vira-latas” entendo eu a inferioridade em que o brasileiro se coloca, voluntariamente, em face do resto do mundo. Isto em todos os setores e, sobretudo, no futebol. Dizer que nós nos julgamos “os maiores” é uma cínica inverdade. Em Wembley, por que perdemos? Por que, diante do quadro inglês, louro e sardento, a equipe brasileira ganiu de humildade. Jamais foi tão evidente e, eu diria mesmo, espetacular o nosso vira-latismo. Na já citada vergonha de 50, éramos superiores aos adversários. Além disso, levávamos a vantagem do empate. Pois bem: — e perdemos da maneira mais abjeta. Por um motivo muito simples: — porque Obdulio nos tratou a pontapés, como se vira-latas fôssemos.

Eu vos digo: — o problema do escrete não é mais de futebol, nem de técnica, nem de tática. Absolutamente. É um problema de fé em si mesmo.

O brasileiro precisa se convencer de que não é um vira-latas e que tem futebol para dar e vender, lá na Suécia. Uma vez que ele se convença disso, ponham-no para correr em campo e ele precisará de dez para segurar, como o chinês da anedota.
Insisto: — para o escrete, ser ou não ser vira-latas, eis a questão.


Versão de Ney Matogrosso, direto de Portugal, em 06 de Maio de 2014.



segunda-feira, 19 de maio de 2014

JOSÉ ALBERTO MUJICA CORDANO

Não há melhor candidato


Não há melhor cabo eleitoral


Não há melhor cidadão


Se você sente o mundo de hoje pobre em exemplos e referências, é porque está procurando nos lugares errados.