Por força das atribulações da vida profissional, o blog anda meio às moscas. Os últimos meses foram intensos, na estrada, e me permitiram uma coisa com a qual já sonhei: num curto período de tempo, estive nas cinco regiões brasileiras.
No Sul maravilha, estive apenas a passeio. Pela BR-101, de carro, e pagando pedágios de R$ 1,70, fui até Florianópolis. Amei o que vi, comi como um rei, mas não moraria. Como ponto turístico, é perfeito. Na volta, parei em Joinville. No Centro-Oeste, onde fixei residência há 26 anos, estive em Goiânia e Brasília, que subiram em meu conceito. É que às vezes, santo de casa não faz milagre, mas, se comparadas com outras capitais... Por exemplo, para chegar à Paulicéia desvairada domingo último, de carro, levei de 3 horas para vencer as modernas e amplas rodovias Ayrton Senna e Carvalho Pinto, até o aeroporto de Guarulhos, num percurso de 120km. Conclusão da ópera: perdi o vôo.
Ainda no sudeste, pelo qual passei mais de uma vez, estive em Sorocaba, Campinas, no Vale do Paraíba, e estiquei ate a praia, na belíssima Trindade, município de Paraty, Rio de Janeiro. Nas últimas três semanas, conheci a tenebrosa Santa Luzia, região metropolitana de Belo Horizonte, encostado no distrito de São Benedito e ouvindo alertas sobre o perigo da violência urbana que eu pensava serem adstritos a São Paulo. Como BH enfeiou desde minha última visita (2004). Que trânsito caótico!
Pegando o gancho da mobilidade urbana, conto que aportei em Salvador antes da folia de carnaval. Me decepcionei com o estereótipo de praia, sombra e água (de coco) fresca. Salvador não tem praia e como estava trabalhando na Av. Paralela (curiosidade geométrica: ela não é paralela a nada), que liga o centro ao aeroporto, passando por incontáveis bairros, aluguei um carro, apenas para o trajeto trabalho-hotel-trabalho. E fiquei mais tempo dentro do Celta prata que consegui a R$ 60,00 a diária, preso nos intermináveis engarrafamentos, do que trabalhando efetivamente no que fui fazer. O que ia pagar de táxi, caso não alugasse o carro, não está no gibi.
E eis que agora escrevo de Rio Branco, no Acre, suando em bicas às 19 horas, no fuso local. Experimentando uma sensação ímpar de separatismo. Não como o dos gaúchos, que se julgam superiores aos mestiços e indolentes brasileiros. Mas também um sentimento de raiva, por tanta tempo de esquecimento e exclusão.A cidade sofre no momento com a falta de alguns produtos, por conta da cheia do Rio Madeira, que impede o transito na BR-364, via terrestre que liga o Acre ao resto do Brasil. Por isso, chegam carretas do Peru, via transoceânica, com todo tipo de produto. É inimaginável a histeria das redes de comunicação com o assunto. Trata-se de estado governado pelo PT há 16 anos e o PIG, mesmo o acreano, fica fulo da vida com isso. É um PT mais afeito à etiqueta palaciana, mas que jamais perderá o mérito de ter expurgado do poder bandidos e assassinos, como Orleir Camelli, Ronivon Santiago e Hildebrando Pascoal.
Enfim, essa são as notícias, mas uma data como essa tem que ser permanentemente lembrada, sob pena de repetirmos o erro. O dia que jamais acabou.
Esse texto foi escrito a exatos dez anos. Passávamos então pelos 40 anos da efeméride que marcou nosso futuro. É interessante notar como em 2004 já havia a preocupação com essa interpretação da história revisionista. Um pecado do original é a citação, em inglês. Ainda que seja uma música de "protesto", que lembra o domingo sangrento, e cantada na voz do oprimido o contexto hoje é de abertura dos arquivos norte-americanos. O U2 é irlandês, mas o nome do meio de John Kennedy, que conspirou à distância, fomentando o discurso ameaçador do comunismo, instando as elites à insubordinação e, principalmente, resguardando o aval político ao que os milicos fizeram, também é (Fitzgerald).
Endosso a ideia de um amigo que fiz nessas andanças, paranaense de Campo Largo: assim como já há a substituição de logradouros públicos como Castelo Branco, Costa e Silva, Médici e corriola, que se substitua o nome de todas as ruas, escolas e instituições que hoje ostentam o patromínico do infame ex-presidente dos EUA que apoiou o golpe militar no Brasil. Infame, como quase todos os outros
Real, but sad, Politik
I can't believe the news today
I can't close my eyes and make it go away.
How long...
How long must we sing this song?
How long, how long?*
As imagens de 40 anos atrás continuam vívidas nas íris de todo
cidadão brasileiro. São marcas indeléveis no corpo nacional. Feridas que
não cicatrizam. O golpe alterou para sempre os destino de todos nós,
até mesmo daqueles que sequer existiam.
Personagens heróicos, dados a voluntariedade, a retidão de
caráter, a fibra e a defesa de ideais, caçados como animais e empalados
em praça pública, de forma exemplar. Personagens infames, metendo o
coturno na cara da sociedade, com todo escárnio e desprezo pela
humanidade, com o escopo de manter a ordem e acelerar o progresso.
Infelizmente, milhares de outros personagens, hoje em dia tratados como
heróicos ou infames, graças às circunstâncias criadas nesse purgatório
terrestre.
Uma ínfima parcela da sociedade conhecia os fundamentos do
comunismo. (aliás, nesse aspecto, pouco coisa mudou!). Pois os golpistas
utilizaram a velha artimanha de instigar o pavor ao desconhecido para
tentar alguma adesão, algum respaldo. Ao invés de levar luz onde há
trevas, conhecimento onde há ignorância, leva-se o medo, e mantém-se a
dominação, intelectual e física. A grande massa, circunstancialmente
covarde, se omitiu.
Mesmo assim, foram repudiados pelo povo. Jamais houve uma
manifestação popular tem apoio ao regime de exceção. Os desfiles de 7 de
setembro lembravam o totalitarismo nazi-fascista. Vaquinhas de
presépio, acuadas, aplaudiam comedidamente o passar dos tanques, que por
qualquer motivo, poderiam esmagá-los instantes depois. Multidão
reunida? Só pelas diretas...
Não menos culpados foram os “intelectuais” que tentaram dar um
quê de racionalidade naquela estupidez. Bob Fields, Mário Henrique
Simonssen, Delfim Netto. Jamais se aproximaram dos porões da ditadura.
Jamais sujaram seus belos ternos, cortes impecáveis, com o sangue dos
inocentes. Porém cometeram, não uma, mas várias vezes, o crime de
lesa-pátria. Tornaram o FGTS um regime obrigatório, esfaqueando o suado
salário do trabalhador. Revogaram a lei de remessa de lucros. Engessaram
a reforma agrária, revertendo nosso campo para a exportação.
Construíram obras faraônicas com o dinheiro público, e enriqueceram
construtores, empreiteiros, conglomerados de mídia. Tornaram a corrupção
uma instituição... Atrelaram definitivamente nossas vida à dívida
externa. E ao FMI.
Um grande monumento à bestialidade humana. O autoritarismo, a
tortura, a violência, o tacão dos tacanhos. DOI-CODI, Dops, as diversas
tecnologias criadas para extrair confissões, e para retirar dignidade.
Atentados contra civis, cavalos pisando homens. Arapongas, traidores,
infiltrados. Repressão, mordaça, AI-5, truculência. Guerra Civil sob os
auspícios de um milagre?! Não, não é para quem tem estômago fraco. É
mais macabro que qualquer ficção. É mais mórbido do que qualquer
adjetivo possa expressar.
Justificando o injustificável. Nos dias de hoje, os historiadores
explicam os acontecimentos passados graças ao “despreparo” de Jango.
Apontam um bode expiatório depois de perpetrada a carnificina. Oprimem,
como fizeram idos atrás os golpistas, e como fazem hoje os organizadores
da divisão social do trabalho, com a reengenharia. Como estes, fundam
uma nova “ciência”: a Rehistória.
Ninguém Lê.com.br – Porque temos memória
(*)Eu não posso acreditar nas notícias de hoje
Eu não posso fechar os olhos e fazê-las desaparecer.
Quanto tempo...
Quanto tempo teremos de cantar esta canção?
Quanto tempo, Quanto tempo?
Um comentário:
Muito legal o texto e a oportunidade que você tem de viajar pelo 'Brasil profundo' e conhecê-lo mais e mais. É sempre melhor falar com conhecimento de causa, da experiência viva. Viva a Transoceânica e abaixo a ditadura! (ainda tem gente que tem saudades da 'Gloriosa').
Abs
Flávio
p.s. Teu blog não tem botões pra compartilhar no Twitter, FB e G+?
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