Já vi 8 copas, estou ficando velho. As duas primeiras (82 e 86), jogamos bem e perdemos. As duas seguintes, jogamos mal. Perdemos uma (90) e ganhamos outra (94). Depois, jogamos bem duas em carreira, e novamente perdemos uma (98) e ganhamos outra (2002). Por fim, as duas mais recentes (06 e 10), jogamos mal e perdemos.
Como se vê, não há muita relação entre jogar bem e vencer. Até porque o primeiro critério é subjetivo, humanos, desperta paixões e controvérsias. Vencer, contudo, é algo que pode se quantificar, contabilizar, precisa e objetivamente.
A importância do tema
Albert Camus dizia “o que finalmente eu mais sei sobre a moral e as obrigações do homem devo ao futebol”. Se costuma dar pouca importância ao futebol nos círculos mais bem informados. É uma contradição, na minha opinião, pois isso deriva em grande parte da forma como é feita a cobertura jornalística do futebol: um besteirol, que presume que quem se interessa por esse tipo de notícias é, no mínimo, um imbecil. Veja o que escreveu a esse respeito Leandro Fortes:
“Passados quase 25 anos, o estilo burlesco de se cobrir esporte no Brasil passou a ser uma regra, quando não uma doutrina, apoiado na tese de que, ao contrário das demais áreas de interesse humano, esporte é apenas uma brincadeira, no fim das contas. Pode ser, quando se fala de handebol, tênis de mesa e salto ornamental, mas não de futebol. O futebol, dentro e fora do país, mobiliza imensos contingentes populacionais e está baseado num fluxo de negócios que envolve, no todo, bilhões de reais. Ao lado de seu caráter lúdico, caminha uma identidade cultural que, no nosso caso, confunde-se com a própria identidade nacional, a ponto de somente ele, o futebol, em tempos de copa, conseguir agregar à sociedade brasileira um genuíno caráter patriótico. Basta ver os carros cobertos de bandeiras no capô e de bandeirolas nas janelas. É o momento em que mesmos os ricos, sempre tão envergonhados dos maus modos da brasilidade, passam a ostentar em seus carrões importados e caminhonetes motor 10.0 esse orgulho verde-e-amarelo de ocasião. Não é pouca coisa, portanto.”
Espero que se finde, de uma vez por todas a Era Dunga, que nos infernizou como jogador e técnico. Imagine um pedreiro que após 30 anos de vivência na profissão ainda não saiba como construir uma casa sólida e bela. É um incompetente. Esse é o Dunga; mas ele é só a ponta do iceberg, um testa de ferro que a CBF colocou à frente do seu selecionado. Talvez seja sacrifício demasiado imputar o símbolo de duas gerações tacanhas a um indivíduo. Talvez, pois entre ser o operário padrão e o líder insubordinado, Dunga vestiu com prazer a primeira farda. Duas vezes.
Vejo na Era Dunga, duas vertentes em sua pequena complexidade, a questão da mentalidade e da parte técnica, pois “Dunga é um cara sem grande imaginação. Honesto nos princípios, aparentemente, mas limitado na criatividade e no trato com as pessoas.”.
Filosofia da mediocridade
Imagine-se no lugar dele: rodeado por cidadãos que moram a milhares de quilômetros do Brasil, com fortunas de vários dígitos (em euros), você tentaria incutir nessas cabeças ocas o fervor patriótico como motivação para o simples bem exercer de seus metiês? É patética essa história de jogar pela pátria: nós torcemos pela seleção, mas ela não é do povo, nem da Globo: é da CBF e patrocinadores. Essa demagogia do Dunga até se casa com o merchand do brahmeiro guerreiro, mas não tem nada a ver com futebol, ainda mais com a nossa tradição futebolística.
Sobre isso, li uma reportagem a respeito de um jogador do carrossel holandês de 74 chamado Johan Neeskens, que era considerado o melhor coadjuvante de Cruyff na laranja mecânica. Em 78, o astro Cruyff se negou a participar, em protesto contra a ditadura argentina (e por força de questões comerciais. Não há idealismo com tanta grana envolvida). Neeskens, por seu turno, afirmou que iria para a Argentina e que suaria sangue, se necessário. Amor à casa de Orange? Não, isso era, segundo o próprio, para “valorizar minha cotação no mercado futebolístico internacional”. Em ambas as copas a Holanda foi vice.
Ainda sobre mentalidade, muito se exaltou o ente chamado grupo. Grupo em futebol, simplesmente é o sentimento de solidariedade que faz com que todos procurem atacar e defender. Lógico que existe a tática, as posições, mas o fator “grupo” faz com que o atleta se desdobre em várias funções, não se contentando com a burocrática execução de sua determinações. O grupo não faz gol, mais serve como um balanceamento ao excesso de individualismo. Na prova de fogo, a situação adversa contra a atual seleção holandesa, o que se viu foi um festival de indivíduos transtornados, correndo com a bola num autêntico “cu-de-boi”, como se diz na pelada. Vedetes consumidas pela vaidade ante o fracasso, se olhando no telão e imaginando as perdas nos contratos de publicidade. O grupo era mentira, criada para atiçar ânimos belicosos de jogadores subservientes.
Futebol não é guerra e não precisa rechear o time de cabos e soldados armados com espingardas e trabucos. É preferível usar jogadores de futebol, bons, se possível. Também não precisamos de “inimigos”. Tentaram eleger Dunga como arauto anti-Globo. Que a cobertura esportiva da Globo é nefasta e perniciosa eu já falei parágrafos acima. Porém, a falta de polidez dele não melhora nada, pelo contrário: agora sim a Vênus platinada terá argumentos de sobra para provar que “torce” pelo Brasil. Xingar um badeco numa entrevista dias após ter dado entrevista exclusiva na bancada do jornal Nacional, para nos restringirmos ao jargão dunguístico, não tem a menor coerência. Dunga de mal da Globo é que nem a Folha falando mal do Sarney. Como pergunta PHA, eles descobriram o Sarney agora?
Na parte técnica, Dunga peca por ignorância. Ele acreditou que Kaká e Robinho são craques. São diferentes, bons jogadores, que executam funções incomuns e têm estilo difícil de imitar. Mas não são craques. A Globo é mais culpada que ele, por fazer parte da “mídia”. Determinados jogadores são pinçados como garotos propaganda e daí ascendem ao status de craque. Na última copa, elegeram Cannavaro o melhor do mundial. Acho que o Chicão do Corínthians é melhor que ele. Nessa copa, as esperanças da Nike estavam depositadas em Rooney, Ribery, Drogba e Cristiano Ronaldo. Não é maldição, talvez coincidência o fato de todos terem voltado para casa bem cedo. O que eu tenho certeza é que são bons jogadores, mas não os fenômenos virtuais que a propaganda vende, e seus “genéricos” estão em qualquer campeonato nacional da América do Sul. Nessa horda de medíocres, os sudacas, sem evoluírem nada, estão se destacando, o que serve de reforço a minha tese de nivelação por baixo dos valores individuais. Craques como Maradona, Ronaldo (o fofo), Zidane (para ficar nos que eu vi jogar) não nascem todo dia, e com o direcionamento que os atletas têm desde tenra idade para os holofotes comerciais, tendem a se tornam espécies em extinção.
Peço desculpa pelo tom de desabafo. No final das contas, eu preferia estar errado. E que a culpa fosse do urucão do Mick Jagger, que foi lá secar o scratch canarinho.
Um comentário:
A culpa é da camisa azul com pintinhas amarelinhas ou do ditador da CBF, é só escolher o que mais te agrada.
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