Durante toda a campanha, a candidata eleita Dilma Rousseff usava em seus discursos o termo "presidenta", como forma feminina de presidente. Na verdade, os substantivos e adjetivos de dois gêneros terminados em -ente não apresentam flexão de gênero feminino (e nem masculino, afinal, são de dois gêneros) terminado em -a. Por esse motivo, não se diz "a gerenta", "a pacienta", "a clienta" etc. Caso fosse correto o uso de "a presidenta", por coerência, diríamos que "a presidenta está contenta" e "o presidente está contento"?*
E o Brasil será presidido pela primeira mulher presidente da nossa história. Com 55.725.529 votos, Dilma Rousseff sucederá Lula, que finda seu mandato com popularidade recorde. Precisamos recorrer à imprensa uruguaia para vermos uma manchete digna do impacto dessa notícia.
Breve antecedente
Os oito anos de governo Lula têm um corte epistemológico bem definido. Até meados de 2005, sua equipe econômica era monetarista, conservadora, elogiosa e submissa ao modelo do governo anterior. Já a política engatinhava no ofício de ser governo, afeito aos conchavos com a base fisiológica do Congresso. Os mais cotados para assumirem o legado de Lula eram Antonio Palocci e José Dirceu.
José Dirceu foi defenestrado cargo de Ministro Chefe da Casa Civil em junho de 2005 por conta do seu envolvimento no esquema do Mensalão. Já em março de 2006, é Palocci que é exonerado do cargo de Ministro da Fazenda. Sua situação ficou insustentável a partir da quebra ilegal do sigilo bancário do caseiro Francenildo Santos Costa, que viu o então ministro se reunindo com lobistas acusados de interferir do governo para benefício particular, partilhando o "butim" e animando festas com garotas de programa.
A partir de então, apesar dos ensaios golpistas da oposição e do PIG, há uma regeneração dos quadros do Poder Executivo. O presidente Lula vai às ruas, se legitimar no apoio popular. Guido Mantega assume o Ministério da Fazenda e faz uma pequena revolução: mantem uma política cambial austera, o que possibilita recordes na reserva; baixa a taxa de juros SELIC; reduz a influência do BC nas decisões políticas; se utiliza dos bancos públicos como agencias de fomento do desenvolvimento. Com essa virada econômica, Dilma Rousseff, que havia sido alçada a Casa Civil, coordena o PAC, lançado em janeiro de 2007. Mais que um programa de expansão do crescimento, o PAC é um novo conceito de investimento em infraestrutura que, aliado a medidas econômicas, vai estimular os setores produtivos e, ao mesmo tempo, levar benefícios sociais para todas as regiões do país. Daí nasce a confiança que Lula deposita em Dilma, e que leva a crer que sua sucessora é que mais estará familiarizada com as políticas de desenvolvimento do país.
O Resultado das Urnas
Ao fim do primeiro turno, o ANTIPIG insistiu que a tarefa da militância seria reverter os votos de Marina Silva e dos demais candidatos derrotados. O resultado, já publicado abaixo, é aqui reproduzido:
Votos em disputa (dos candidatos derrotados): 20.806.436 Crescimento de votos de Dilma (do primeiro para o segundo turno): 8.101.059 Crescimento de votos de Serra (do primeiro para o segundo turno): 10.579.016 Descréscimo do total de votos válidos (do primeiro para o segundo turno): 2.126.361
A partir destes números, vemos que a famigerada abstenção, supostamente causada pelo feriado prolongado não foi determinante no resultado na eleição. O decréscimo no total de votos válidos ainda foi atenuado pela diminuição dos votos brancos e nulos: 9.603.594 no 1.º turno e 7.142.013 no 2.º turno. Ou seja: quem foi votar, o fez com maior convicção e com menor sentimento de obrigação.
Se somarmos o crescimento de votos de Dilma e Serra, veremos que a candidata vitoriosa ficou com 43,37% deles, enquanto o derrotado Serra recebeu 56,63%. Grosso modo, podemos afirmar que os votos de Marina migraram em sua maioria para Serra, mas não o suficiente para reverter o resultado da eleição.
Outra afirmação é que Dilma venceu a eleição mesmo desconsiderando os votos do Norte e do Nordeste. Gunter Zibell, do portal Luis Nassif fez uma brilhante análise, comparando os resultados da eleição de 2010 com a de 2006. Dilma só obteve mais votos que Lula no RS. Mas nos estados tipicamente tucanos (os do Sul, São Paulo e os dois Mato Grosso), as votações foram muito semelhantes:
Sul : Lula = 46,5% > Dilma = 46,1% (redução de 0,4%)
SP : Lula = 47,7% > Dilma = 45,9% (redução de 1,8%)
MS+MT : Lula = 47,6% > Dilma = 47,1% (redução de 0,5%)
Já nos estados mais lulistas, a perda de votos foi mais significativa, chegando a quase 9% nos estados da Região Sudeste:
Nordeste : Lula = 77,2% > Dilma = 70,6% (redução de 6,6%) Norte : Lula = 65,5% > Dilma = 57,4% (redução de 8,1%) RJ+MG+ES : Lula = 67,0% > Dilma = 58,4% (redução de 8,6%)Várias são as conjecturas. Também farei as minhas:
- Os estados do sul são mais pragmáticos e mais insensíveis às mudanças.
- Dilma teve mais votos que Lula no RS graças ao PT local, que venceu a eleição para Governador, Tarso Genro.
- Aécio impactou significativamente pró-PSDB, apesar da guerra interna que eles travam.
- Não faço idéia do que aconteceu no ES. Para apurar.
- A paúra religiosa fez mais estragos no Nordeste e Norte.
- Grande parte da elevação social para classe média se deu no Nordeste. O sentimento de não mais precisar do governo, um misto de ingratidão e egoísmo se fez presente em cidades como Natal, Aracaju, Maceió e Campina Grande.
* http://www.advivo.com.br/blog/luisnassif/presidente-ou-presidenta
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