quarta-feira, 19 de junho de 2013

ENTENDENDO

O português é uma língua fascinante. Esse tempo verbal, no qual as coisas estão em processo de acontecimento, o que é diferente do ato instantâneo do presente, é uma preciosidade. Tão massacrado pelo mal uso, o gerúndio merecia um destino mais glorioso que os scripts dos call centers.

Ontem à noite estava tateando sobre quais seriam as consequências dos protestos. Rascunhei uma série de paragráfos sem conexão necessária entre si e garimpei algumas fotos por aí. Sem usar o termo, é óbvio que os ânimos exaltados deixavam poucas opções para o desfecho das mobilizações: ou o nada, tragado pelo dispersão atávica que os tumultos demonstravam, ou o tudo, que nesse caso era uma sublevação completa da ordem. Apesar das contradições, é o PT quem capitanea o status quo vigente. A insurreição é para derrubar o governo do PT. Se isso é bom ou ruim, é matéria para outras reflexões. Por fim, com qualquer resultado, essa centelha de cidadania se apaga e reflui o anseio por debater os problemas políticos urgentes.

Porém, já questionava o caráter ideológico do "movimento" (entre aspas, por que de movimento em sentido tradicional pouco há). Há várias nuances esquerdistas, como a crítica dos gastos públicos com a realização da Copa do Mundo (aí vem o Haddad falar que se congelar a tarifa, o subsídio da prefeitura sobre de R$ 1,2 bi para R$ 2,7 bi, por ano. O estádio em Brasília custou R$ 1,4 bi) mas no geral não enxergava um rumo de esquerda, como a Cynara Menezes, o Leonardo Sakamoto, o Menon e outros que saudavam o povo na rua, o país que acordava de uma suposta letargia (que asneira: nunca se trabalhou tanto!), os filhos deste solo que não fogem à luta. Hoje, resta evidente: é de direita.

Os exemplos pipocam, amiúde. Desde a catequese do Rodrigo Vianna e o do Sakamoto (de novo), diretamente aos manifestantes, até ao já alertado desfile de beldades globais, tanto com a cara pintada no ensaio fotográfico em homenagem à mártir das passeatas, a repórter da folha, jornal que exultou a violência policial, quanto com os cartazes artesanais: "Ou para a roubalheira ou paramos o Brasil".

Desde que foi cooptado pelo maior partido de direita do Brasil, o PIG, cuja derrota é o objetivo precípuo e final deste blog, os protestos se voltaram para o golpismo puro e simples. É o grande risco da organização social dita horizontal: manter o norte quando há tantos tubarões nadando nos mares da hipocrisia chamada neutralidade. E também era a bomba relógio do lulismo: inclusão social sem a contrapartida em politização das agendas públicas. Ou, na linguagem dos manifestantes, falta de instrumentos da democracia direta.

Vários blogueiros, companheiros de viagem perceberam isso, alguns mais rápido que outros. Carlos Motta, Paulo Henrique Amorim, Secco e David (que escrevem no blog do Azenha) e os que comentam as notícias se deram conta que é irreversível o processo de abdução da pauta de redução dos R$ 0,20 da passagem de ônibus para o golpe antipetista, reacionário, burgês, recheado de todos os recalques e sentimentos mesquinhos que movem a patota que não se conforma em ter que largar o osso e não admitem um governo de caráter trabalhista, apesar dos defeitos.


Lula e o PT sacaram que o subproletariado quer o Estado protetor, mas sem ruptura, instabilidade política ou greves, pois é a classe mais desprotegida politicamente. Eles não têm sindicato, não tem em que se apoiar diante de uma instabilidade política aguda.

Desde então, se adota uma política de "reformismo fraco" e "desmobilizador". Isso explica por que se andou mais rápido no aumento da renda dos pobres e mais devagar na redução da desigualdade de renda entre os ricos e os pobres. Lula polarizou o embate político entre "ricos" e "pobres", o que não se prende às categorias clássicas de "direita" e "esquerda".



No meio da multidão não se viam "pobres", muito pelo contrário.


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