domingo, 21 de julho de 2013

EM ALGUM LUGAR DO PASSADO

Domingo é um dia propício a recordações e melancolia. Nesse estado de ânimo, participei de um bate-papo sobre um assunto em essência "capitalista", mas que ainda me atrai: carros antigos. E dessa conversa surgiram algumas divagações...

O brasileiro ERA um povo bem humorado. Os carros tinham apelido. O garboso SIMCA Chambord, por exemplo, recebeu a alcunha de "Belo Antonio", graças ao filme estrelado por Marcello Mastroianni, que fazia o papel de um galã que na hora H não correspondia. Assim era o carro: bonito, bem acabado, com itens de conforto jamais pensados pelo consumidor brasileiro, mas com desempenho pífio, que frustrava expectativas. A empresa reformulou várias vezes o conjunto mecânico, mas não teve jeito: o apelido pegou.



Outro exemplo foi o Volkswagen 1600 Sedan. O automóvel, que foi fabricado menos de três anos (meados de 68-70), teve boa aceitação, com quase 25.000 unidades vendidas. Mesmo assim, não atendeu aos anseios da empresa, que focava o segmento de carros médios. O Zé do Caixão, contudo, se tornou o queridinho dos taxistas, rebaixando o status almejado pela Volkswagen. Meses antes do seu lançamento, o cineasta hoje cult José Mojica Marins havia lançado um dos seus filmes trash: "O estranho mundo de Zé do Caixão". Tal denominação, ainda que contivesse boa dose de simpatia, acabou por abalar ainda mais o prestígio do veículo.
Ainda tinha o Renault Dauphine, chamado de leite glória, em referência ao comercial de leite em pó da época, aquele que "desmancha antes de bater". E outros.

No futebol então, os exemplos são incontáveis. Além dos jogadores se apresentarem ao público com apelidos - Pelé, Garrincha, Tostão, Didi, Zito, Pepe - recebiam outras alcunhas na crônica esportiva que os consagravam. Rivellino era o reizinho do parque; Ademir da Guia, o divino; Gerson, o canhotinha de ouro; Joel Camargo, o açucareiro. E por aí vai...

Hoje, nomes insossos. Automotivos e futebolísticos. O que significa um carro chamar HB20? E os nomes compostos dos atletas? Chegou-se ao cúmulo da escalação da zaga brasileira ter 10 palavras: Julio Cesar; Daniel Alves, Thiago Silva, David Luiz e Felipe Luís. Nem o David Luiz, com aquele espanador na cabeça, recebeu um cognome que fosse...

Tempos politicamente corretos, da importação de costumes, tanto dos sisudos europeus quanto dos práticos americanos. Afirmações corretas, porém superficiais. Houve algo mais profundo, que feriu de morte a alegria brasileira. E a falta de alegria é sinônimo da falta de amor. E falta de amor é terreno fértil para propagação do ódio.

Sem respostas conclusivas, acrescento aí o papel da mídia, que ficou bem claro mês passado. Como escreveu Hildegard Angel, "Fomentado pela grande mídia, o ódio da classe média manifesta-se nas mídias sociais, nas ruas, nas cartas aos jornais, nos bares, nas conversas."

A colunista enfiou o dedo na ferida:

"Tanto fizeram, tanto insistiram, numa campanha de tal forma poderosa, insidiosa, obsessiva, continuada, que conseguiram chegar ao cenário que pretendiam: o país desmoralizado internacionalmente, a presidenta impopular, a economia em queda, manifestações nas ruas.
Cegos, imprevidentes, imprudentes, os donos desta mídia, os membros desta sigla, PIG – de Partido da Imprensa Golpista – acabam por dar o Golpe neles próprios, pois a primeira vítima é ela mesma, a mídia, que acendeu o fósforo, mas quem jogou a gasolina foi o Facebook, foi o Google. Só então a grande e forte mídia brasileira percebeu o quão é pequena e frágil, uma formiguinha, perto das redes sociais.
E deu no que deu: para cobrir as manifestações, só com os repórteres no alto dos prédios, dialogando com os cinegrafistas no alto dos helicópteros. Se chegassem às ruas, eram escorraçados, enxovalhados, linchados. Os microfones, pelados: não podiam exibir logomarca de emissora."

Aproveitando-se do vácuo cultural criado na ditadura militar, a mídia instigou as piores neuras no seu público. Os programas policiais, as páginas que quando retorcidas gotejam sangue, o enfoque na desgraça, tudo isso se alastrou. A ênfase no que há de pior na humanidade assumiu o papel da crítica, que além de proibida pelos milicos se transformou em motivo de tristeza e tragédia, como na família da própria Hildegard Angel.  A verdadeira crítica, instrumento intelectual poderoso regrediu ao complexo de vira latas até no futebol, na recente copa das confederações, sucesso esportivo e comercial, ofuscado pela avalanche de protestos.

Mas voltando ao nosso tema, diz o vanguardista que prefere a eficiência do IX35 ao esbanjamento dos Dojões; a produtividade do Leandro Damião ante o carisma do Fio Maravilha. Sei não. Duvido que Jorge Benjor faria músicas para Fellype Gabriel, Renato Abreu e Bruno César. Mas concordo que aprendemos algo: a andar para trás. Moderno, mas não me agrada.

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